A economia da atenção e o paradoxo do nosso tempo

A atenção humana é um bem escasso.

Nunca tivemos acesso a tanta informação. Mas muita informação resulta em pouca atenção. E enquanto nossa atenção é um bem limitado, a capacidade de receber estímulos e informação, não. Existem diferentes definições para a economia da atenção. Entre todas elas e depois de estudar diferentes visões sobre o tema, essa é minha:

A economia da atenção é uma abordagem social que estuda a atenção como um bem escasso e todas as consequências do excesso de informação e estímulos na vida das pessoas.

Nossa atenção sempre foi limitada, valiosa e escassa. O que difere as discussões atuais é que os avanços tecnológicos tornam disponíveis e acessíveis uma quantidade esmagadora de informação, estrategicamente destinada a captar a nossa atenção.

No nosso mundo de comunicação e marcas, quando a atenção é limitada, as pessoas escolhem de forma bastante criteriosa onde irão gastar o que lhe resta de atenção (e energia).

Isso explica a proliferação das tribos e comunidades. Quando o usuário tem muito a escolher, ele opta por grupos onde teoricamente se sentirá acolhido pelos temas e pelas pessoas.

Outra resposta da comunicação à economia da atenção é o papel valioso da curadoria. Newsletter são prova disso. Marcas e profissionais que conseguem ter um olhar criterioso do que é mais relevante para seu público, poderão tornar suas expressões mais saudáveis e leves, diminuindo a sensação de que estamos sempre perdendo algo e com medo de “ficar de fora” (é síndrome de FOMO).

Até porque muita informação não quer dizer qualidade.

Como profissionais e eternos estudantes, somos seduzidos pelo poder da dopamina por um consumo frenético de notícias, estudos de caso e conteúdo técnicos ou não, mas quando optamos por consumir tudo, na verdade não consumimos nada.

Michael Goldhaber, ex-físico e um dos pensadores sobre o tema, disse que “Numa economia da atenção, nunca estamos desligados, pelo menos quando estamos acordados, uma vez que quase sempre estamos prestando, recebendo ou buscando atenção.”

Para as marcas é um momento vital de mudança.

Marcas estão proliferando em todas as plataformas e canais possíveis e disponíveis. Mas muito acaba sendo bastante unilateral e passageiro – os usuários olham e seguem em frente.

Todos nós, como indivíduos, temos ao menos uma noção de que estamos vivendo uma vida de excessos. Mas e como estrategistas de marcas? Muitas vezes continuamos gerindo marcas como se não estivéssemos vivendo uma vida onde uma pessoa tem contato com cerca de 362 anúncios por dia. As marcas que querem fazer sentido neste contexto precisam gerar valor pela experiência, sensorialidade, criatividade, comunidade e curadoria. Esses são alguns temas que abordaremos por aqui.

Por fim, se engana quem acredita que esse é um assunto só para o marketing. Ainda parafraseando Goldhaber, qualquer discussão sobre poder é agora uma discussão sobre atenção e como a usamos, a desperdiçamos, a vendemos, a perdemos e lucramos com ela. Espero que essa seja uma edição provocadora e valiosa para você.

“Uma era rica em informação provoca a escassez do que ela consome. E o que ela consome é óbvio, é a atenção de seus receptores”.

Apesar de ser um tema extremamente atual, a Economia da Atenção é um assunto abordado pela primeira vez pelo economista e Prêmio Nobel Herbert A. Simon, tema consagrado na conferência “Designing Organizations for an information-rich world”, de 1971.

Simon reconheceu que a teoria da administração é amplamente uma teoria que se baseia na tomada de decisão humana, e, como tal, deve ser fundamentada tanto na economia quanto na psicologia. Ele investigou e analisou o fato de que os processos comportamentais e cognitivos dos seres humanos não necessariamente resultam em escolhas racionais, desafiando a suposição da teoria tradicional da época.

Verificamos nosso celular cerca de 150 vezes por dia. A Apple diz que desbloqueamos o iPhone cerca de 80 vezes. E se for um Android, o número aumenta para 110.

Por que agora?

Uma tendência nunca está sozinha.

Ela só emerge porque outros movimentos e comportamentos a empurram e são como pilares de algo maior. Veja como as discussões sobre a "Economia da Atenção" está também conectado a outras ideias e ações individuais e coletivas.

📺 De publicidade para entretenimento

Em um artigo na Harvard Business Review, Mark Purdy e Gene Reznik argumental que "daqui para frente, todas as empresas , incluindo mesmo aquelas que não estão atualmente envolvidas com entretenimento, devem pensar e agir como artistas." Além do próprio universo do entretenimento, a publicidade também caminha para essa direção, visando aumentar o poder de um conteúdo mais envolvente e aumentando ainda mais as opções de acesso da sociedade.

📱 Tiktokificação da atenção: o poder da dopamina

Nossos celulares viraram uma extensão do nosso corpo. Os aplicativos e sites (principalmente as redes sociais) são criados para ocupar o máximo do seu tempo e chamar sua atenção o máximo possível. Isso significa que o "scroll" é como uma máquina de caça-níqueis: nunca sabemos quando virá uma recompensa, então nunca paramos de "rolar".

🧨 Policrise e paralisia emocional

A multiplicidade de crises (choques econômicos, sociais, ambientais, sanitários e humanitários) geram uma paralisia emocional e social causada pelo estresse e desorientação em relação a velocidade em que as coisas mudam atualmente. Essa situação torna nossa atenção ainda mais limitada e focada em resolver os desafios mais essenciais do nosso dia.

⌚️ Covid e a aceleração do processo

Com o isolamento social gerado pela Covid-19, adaptamos tarefas e passamos a usar mais as telas para trabalho, estudo e relacionamento. Uma pesquisa realizada pelo IBGE, em 2019, apontou que 94,7% dos alunos utilizam o celular para os estudos. Com isso, separar trabalho e estudos do uso social e informal torna-se ainda mais desafiador e causa ainda mais distração.

Bolhas sociais, atenção no que importa e comunidades de marcas

As bolhas sociais funcionam como um filtro natural que nos permite nos concentrar só no que realmente importa. Mas, ao mesmo tempo que elas são um alento, também apresentam um grande dilema.

Essas bolhas funcionam como guias, nos levando diretamente para as informações que mais se aproximam com o que estamos buscando naquele momento. Ter essa atenção seletiva economiza nosso tempo e energia, permitindo um mergulho muito mais profundo em tópicos que realmente nos interessam.

É aqui que as comunidades de marcas também aparecem. Essas comunidades são formadas em torno de marcas que reconhecem a importância de cultivar relacionamentos autênticos com seus clientes e entre seus membros. Basicamente, o objetivo é estimular conexões em grupos com afinidades e visões de mundo semelhantes em torno de um elemento em comum: aquela marca.

O lado positivo desse filtro é evidente. As bolhas sociais e as comunidades nos ajudam a nos manter atualizados sobre tópicos que gostamos, criando conexões com pessoas que compartilham dos mesmos interesses. Isso cria um senso de pertencimento e comunidade que é admirável em um mundo cada vez mais líquido.

Porém, existe um problema nisso tudo. Bolhas sociais podem ser limitantes. Quando estamos imersos apenas em perspectivas e opiniões semelhantes, nossa visão de mundo tende a estreitar, correndo risco de evoluir para uma grande miopia. Isso pode contribuir para um entendimento limitado da complexidade da sociedade. É como viver em um túnel com eco onde todas as vozes ecoam as mesmas ideias.

É preciso sabedoria para usar esse filtro. Saber reconhecer a existência das bolhas sociais e estar disposto a sair delas de vez em quando. É importante procurar informações que desafiem nossas opiniões e perspectivas e que estimulem o nosso crescimento intelectual e emocional.

“Muitas empresas perceberam que havia este recurso natural ao seu redor: a atenção das pessoas; se você lhes der coisas de graça, poderá chamar a atenção delas e vender mais ”

James Williams

#ReverberarÉQuestionar

Big techs, algoritmos e o indivíduo como produto

"Se é de graça, você é o produto". As redes sociais, buscadores, streamings e tantos outros serviços digitais “gratuitos” que incorporamos em nosso dia a dia disponibilizam tanto conteúdo porque querem contribuir com o nosso letramento digital. Será? Ou estamos sendo tratados como moeda de troca sem ao mesmo nos dar conta?

Tudo começa com os algoritmos. Eles registram quais sites visitamos, o que pesquisamos e com quem conversamos. Com base nessas informações, criam uma espécie de perfil virtual sobre nós. Esse perfil é valioso para as big techs que o vendem para anunciantes.

Assim, sem percebermos, nossos dados pessoais se transformam em uma moeda de troca. Isso acontece porque as grandes empresas de tecnologia querem que o usuário passe o máximo de tempo possível usando seus serviços. Quanto mais tempo você gasta, mais anúncios podem mostrar a você, o que gera dinheiro para elas. A nossa atenção é valiosa no sentido mais literal da palavra.

Compartilhar nossos dados pessoais pode até ser conveniente, pois nos permite ver anúncios e conteúdo que parecem feitos especialmente para nós. Mas também significa abrir mão de parte da nossa privacidade. Até onde isso pode ser interessante?

E não são só os nossos dados que estão em jogo. Também existe uma disputa pela nossa atenção entre os concorrentes, o que muitas vezes, nos faz sentir como se estivéssemos presos em um ciclo vicioso de rolagem infinita e checagem constante de notificações.

A boa notícia é que a regulamentação está começando a abordar essas preocupações. Está aí a LGDP que promete proteger proteger nossos dados e colocar um filtro na comercialização desenfreada do usuário. E da nossa tão disputada atenção.

Melissa e seu ativo
sensorial
Collabs para
saúde mental

Ações de marcas que focam em saúde mental de clientes e colaboradores estão em alta. No último ano, a collab entre Pinterest e Headspace ofereceu a centenas de milhares de criadores uma assinatura gratuita de 6 meses do Headspace em 20 países ao redor do mundo. A ação apoia os criadores a manterem-se equilibrados e a integrarem práticas de bem-estar nas suas vidas cotidianas.

A Melissa é sempre um ótimo case de brandsense: marcas que possuem ativos sensoriais fortes. Nas últimas semanas, duas ações chamaram a atenção: uma ação que proporcionará uma viagem sensorial e afetiva no VLT do Rio com icônica essência e uma linha exclusiva com O Boticário. Em época de escassez de atenção, as marcas sensoriais podem sair na frente para serem percebidas e lembradas.

Skims
Surrealista

Como chamar atenção quando há uma enorme poluição visual e marcas gritando por todo lado? A marca Skims, da influenciadora Kim Kardashian, chocou o público com o polêmico desfile da Schiaparelli. Os visuais surrealistas, tendência apresentada pelo WGSN, podem ser uma forma de sair do convencional e conquistar alguns segundos a mais do consumidor.

Marcas & Manifestações

4 formas para sua marca mergulhar nesta tendência

Como podemos "chamar a atenção"? Essas dicas tem um olhar mais humano em relação à tendência, ok?

1. Do digital para o físico

Construir vínculos no mundo físico é importante para sua marca. Mesmo que você seja uma marca nativa digital, criar eventos e experiências onde as pessoas possam se conhecer e compartilhar seus anseios é uma forma valiosa de gerar relacionamentos duradouros com seu público.

2. Menos formulários e rastreamento

O consumidor está cansado de deixar seus dados em tudo que é página de conteúdo. Alguns estudos sobre o "novo inbound" recomendam uma estrutura de pontos de contato mais sólida e menos ações que obriguem o usuário a deixar seus dados. É o que tentamos fazer com o Reverbera: um exemplo de conteúdo aberto para o usuário voltar quantas vezes quiser sem ter que abrir um PDF ou colocar seus dados toda hora.

3. Comunidades e acolhimento

Comunidades são (ou devem ser) lugares seguros e acolhedores onde o usuário escolhe estar porque sabe que vai compartilhar dúvidas e se conectar com pessoas dentro de um tema e uma facilitação que enxerga valor. Comunidades engajadas são um reflexo de usuários que preferem doar sua atenção em um ambiente relevante para suas dores.

4. Marcas sensoriais

Quando nossos olhos e ouvidos começam a bloquear a tempestade de informação que tenta chegar até nós, talvez seja hora de começar a contar nossas histórias por meio de outros sentidos. Sua marca tem textura, cheiro e sabor? Marcas sensoriais podem sair na frente em uma era onde a atenção é escassa.

5. Curadoria

Se o público está sendo bombardeado por informação, uma ótima forma de gerar valor e ainda acalmar seus corações dizendo algo com "eu mostrarei a você o que realmente importa" é fazendo uma curadoria dentro da sua categoria, com um olhar bastante criterioso que imprima seus valores e ideias sobre o mundo.

Para continuar estudando:

  • Esse vídeo da WGSN fala sobre a cultura do caos e os visuais surrealista.

  • Se quiser se aprofundar, o livro (em inglês) "The Attention Merchants: The Epic Scramble to Get Inside Our Heads" conta de forma cronológica como a mídia evolui até chegarmos nesse momento de escassez da atenção com o advento da internet;

  • Se quiser ler mais sobre FOMO, ansiedade e redes sociais, esse é um dos artigos que trouxeram o tema como conhecemos hoje;

  • Cara, isso é muito Black Mirror. Falando neles, ao primeiro episódio da terceira temporada é uma das interessantes alegorias sobre ansiedade e o efeito dopamina das redes (e aprovações) sociais. Essa análise feita po um psicólogo é bem legal para expandir o tema;

  • O conceito de wellness building é uma resposta não só á economia da atenção, mas para nossa sociedade que busca equilíbrio. A arquitetura como cura é uma tendência nos empreendimentos do futuro (e do presente);

Espero que esta edição do Reverbera tenha provocado suas percepções de alguma forma. Será que sua atenção chegou até aqui?

Obrigado por fazer parte de mais um estudo. Compartilhe com os amigos para que possamos manter esse projeto tão querido vivo por muitas e muitas edições.

Até a próxima.

O Reverbera analisa macro e micro tendências que impactam o mundo das marcas. Desde grandes movimentos socioculturais até mudanças específicas em comportamentos e preferências de consumo. Ele pode abordar temas como sustentabilidade, inclusão, digitalização, personalização, novas formas de trabalho, experiência do cliente, entre outros.

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